TESTEMUNHOS
E CONTRIBUTOS
38ª Companhia de Comandos — "Os Leopardos"
Símbolos Militares
Boinas, Emblemas e Crachás
Aos meus companheiros da
38ªCompanhia de Comandos mas também a todos os outros que comigo
serviram e compartilharam esforços tanto no Ultramar como no
Continente.
O que me traz aqui hoje pretende ser uma breve reflexão sobre o
assunto em título, numa tentativa de expor e clarificar a forma
como ele deve ser entendido.
Todos sabeis que frequentei a Academia Militar na primeira
metade da década de sessenta do seculo passado (já sou entradote)
tendo iniciado o meu período de combatente em 1967 e terminado
em meados de 1973. Com a CCaç 1639, com a 20ª Companhia de
Comandos, no Centro de Instrução de Comandos de Angola e
convosco reparti estes anos onde aprendi a pôr em prática o que
anteriormente me ensinaram e onde também ensinei, formei e
liderei muitos combatentes com que tive a Honra e o Privilégio
de servir Portugal.
Desde a primeira comissão que me apercebi que para além dos
emblemas que estavam em uso no Exército no princípio da Guerra,
outros rapidamente entraram em vigor conjugados com os novos
fardamentos adaptados ao conflito que fomos obrigados a travar.
Uns e outros traziam a lume algo que tem a ver com espirito de
corpo, mais alem com o moral das tropas que a todos interessava
cuidar. Eram emblemas com desenhos e inscrições que emulavam
quem com garbo e orgulho os exibiam nos locais destinados que os
novos uniformes, com destaque para os camuflados, permitiam. No
peito de cada militar, longe de casa, da família, das namoradas
algo lhes aumentava o ânimo e coragem para enfrentar os sempre
difíceis dois anos que por norma duravam as comissões.
Ainda hoje na carta convite que me enviou o Batalhão 1901 de que
a CCaç1639 fazia parte, comunicando a realização do próximo
almoço lá aparece o logotipo com o lema “Excelente e Valoroso”,
o que mostra a importância que estes “Distintivos” mereciam, já
quase cinquenta anos passados e ainda em utilização.
A entrada nos Comandos alargou este meu conhecimento que aqui se
juntou à vontade de conquistar os símbolos da especialidade.
Ao tempo apercebi-me que havia a esperança que algum dia
seriamos autorizados a usar uma boina própria de que efémeras
tentativas feitas por pelo menos duas Companhias de Comandos,
dão disso conta. Então os ventos eram muito parcos de inovações
e tivemos que esperar que um novo regime trouxesse novas marcas
e outros sinais.
No Exército, os Comandos foram a primeira Força a quem foi
permitido usar a boina de cor diferente num processo que pelo
menos teve dois momentos isto é alem dos elementos Comando,
houve um período em que também os restante pessoal do Regimento
usou a boina vermelha.
Mas hoje estou aqui para vos falar da forma como o processo
aconteceu no CIOE, nossa casa inicial onde decorreu a instrução
da 38ºCC.
Aí aprendeste a disparar todas as armas e em especial a G-3,
individualmente e em equipa, utilizando a pista de combate de
Lalim onde grossas penedias deixaram boas marcas nos vossos
cotovelos e joelhos. Com a ajuda dos instrutores fostes
ensinados a não disparar para o chão pois poderiam ficar feridos
nem a disparar para o lado pois poderiam atingir os companheiros
de equipa.
Os ensinamentos mantem-se até hoje. No dia-a-dia continuamos a
viver com os mesmos ideais com que nos formamos e combatemos.
Recordo-vos como por norma iniciávamos os nossos dias na Guiné,
fosse nos quarteis das vilas/cidades de Mansoa ou Teixeira Pinto
ou na aldeia indígena de Gampará hasteando a nossa querida
Bandeira e lendo o Código Comando a que se seguia a GE no
terreno junto à rede de arame farpado que nos separava da mata,
onde às vezes se acoitava o nosso inimigo. Quantas vezes a bola
com que jogávamos o “brutebol” não ultrapassou a rede?
Mas porque vem tudo isto? Tudo tem a ver com a nossa condição de
veteranos combatentes. Continuamos a não poder dar tiros nos pés
nem disparar contra quem está ao nosso lado. Devemos manter a
nossa união como geração que enfrentou com coragem as
vicissitudes da guerra, deixando às gerações mais novas um
legado de respeito e não de quezílias e querelas que não levam a
lado nenhum.
Acima falo-vos dos incentivos que nos moviam. Não era certamente
a boina pois ainda não existia, mas certamente a cerimónia
matinal era a materialização daquilo que nos animava. Algumas
vezes acompanhada pela entrega de armamento ou para honrar a
memória daqueles que ao nosso lado deram o melhor que tinham de
si. Foi com este espirito que vivemos e o cultivamos mesmo nas
circunstâncias mais difíceis que aqui vos recordo. Honrar a
nossa Bandeira ou os nossos Símbolos, toda a 38ªCC o sabe muito
bem, principalmente quando é feito longe dos holofotes, dos
média etc., etc…e a este propósito recordo aqui as palavras do
Senhor:
“ Sobre a cadeira de Moisés sentaram-se os escribas e os
fariseus. Observai, pois, e fazei tudo o que eles vos disserem,
mas não imitem as suas acções, porque dizem e não fazem. Atam
cargas pesadas e impossíveis de levar, sobre os ombros dos
outros homens, mas nem com um dedo as querem mover. Fazem todas
as suas obras para serem vistos pelos homens. Trazem mais largas
as filactérias e mais compridas as franjas dos seus mantos.
Gostam de ter os primeiros lugares nos banquetes e as primeiras
cadeiras nas sinagogas, das saudações na praça, e de serem
chamados rabi pelos homens. ….”
As Operações Especiais também por direito próprio tiveram
autorizado o uso de boina e insígnias específicas. No âmbito foi
legislado e regulado em conformidade, o seu uso. Assim se
procedeu e as primeiras tropas que tiveram o privilégio de no
Exército usar a boina castanha (Caçadores Especiais) foram
logicamente autorizadas a usar agora a boina verde “Seco” e o
novo emblema da especialidade. Alem desta situação muitas outras
inclusive a minha por ter sido instrutor e comandante da
companhia que formava os ranger`s (e mais tarde Comandante de
Batalhão de Operações Especiais, 2ºCmadt e Cmdt) com todo o
fundamento já que eu não entenderia quem instrói e forma não
tenha direito ao uso de símbolos que os seus novos subordinados
passaram a ter por acção específica de quem conduziu a instrução.
Há muitos anos que sou sócio da Liga dos Combatentes da Grande
Guerra, inscrito na Delegação de Lamego e com as cotas em dia.
Nas funções de Comandante da Unidade tive a Honra de poder
convidar o General Director da LCC para em cerimónia solene
aceitar receber os símbolos a que tinha direito conforme
legislado e regulado. Com muita estranheza tomei conhecimento de
que alguém, não sei com que autoridade resolveu contestar,
passados cerca de vinte anos os factos e a sua legalidade. (a
forma como se expressou fez-me lembrar o Evangelho que acima
citei, acrescido de laivos de Santo Oficio…) Tenho visto muita
coisa, eu sei que nisto de legalidades muita tinta tem corrido…
mas prezo-me que nas nossas Escolas Militares os títulos que são
atribuídos são-no de acordo com os méritos revelados por quem os
recebe… poderá acontecer infelizmente que combatentes de valor
não tenham sido devidamente assinalados, mas temos sempre a
esperança que ao dobrar da esquina, a justiça pode corrigir
omissão ou erros que a volatilidade dos tempos vividos permitiu
acontecer.
Foto:
C.M. Cascais
Pessoalmente transmito ao Digníssimo General Presidente da LCC
que continuarei a sentir-me muito honrado por ver que continua a
usar com todo o direito a sua boina com o símbolo de Operações
Especiais a cuja entrega em cerimónia no CIOE tive o privilégio
de testemunhar.
Para finalizar este apontamento adaptaria aqui as palavras do
Poeta: “ três vezes à volta da praça andou e disse com que
autoridade pois em causa aquilo que é foro meu?….”
Saibam pois meu Bravos Companheiros saber o que na realidade é
importante….
PS: sinto-me muito satisfeito pela actual legislação não
permitir que militares reformados possam usar os seus uniformes
fora dos contextos próprios da Instituição. A revogação desta
norma seria um primeiro passo para o regresso aos tempos
conturbados que muito de nós, infelizmente tivemos que viver.
Victor Pinto Ferreira
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